Em 1933, o futebol brasileiro preparava-se para sofrer uma mudança radical. Até esse momento, o esporte era ainda amador e, a partir dele, o profissionalismo é oficializado – primeiramente no Rio de Janeiro e São Paulo, para depois atingir os outros Estados. Entre 1933 e 1938, perdurou a discussão se o amadorismo deveria ser resgatado ou se o profissionalismo seria mesmo necessário e inevitável. Havia defensores de ambos os lados. Oficialmente prevalece o profissionalismo no esporte, o que iria tirar o futebol brasileiro de um âmbito regionalista para começar a projetá-lo internacionalmente. Entretanto, podemos dizer que o nosso profissionalismo não obedeceu bem aos padrões internacionais. Na verdade, o que prevaleceu foi uma espécie de profissionalismo amador, já que a maioria das medidas adotadas até hoje em grandes clubes e associações foge ao verdadeiro significado da palavra. Talvez seja isso que marque o futebol brasileiro e o torne diferente dos demais países. A meta inicial era, com isso, um ponto final no “amadorismo marrom” predominante em praticamente todo o país.
Além disso, se fazia necessário uma mudança: existia a necessidade de que todos os clubes brasileiros procurassem se estruturar de uma maneira mais séria, objetivando disputar de forma mais profissional as competições das quais tomariam parte. Mas, para que tal ocorresse, seria necessário oferecer aos técnicos e atletas tempo para realizar treinamentos técnico e tático, preparação física, receber cuidados médicos para as contusões, além das concentrações e diversas atividades que iriam impedir que exercessem uma outra profissão, já que estariam praticamente dedicando-se “full-time” à prática do futebol. Esporte que, à esta altura, já havia se tornado a grande paixão do povo brasileiro, com torcedores apaixonados que passaram a exigir cada vez mais dos times pelos quais torciam, cobrando a contratação de craques. Tudo com o objetivo de ver suas equipes cada vez mais fortes, em condições de lutar e vencer as competições das quais tomavam parte.
Para decidir essas questões, duas reuniões foram realizadas. A primeira realizada no Rio de Janeiro, e a segunda, em São Paulo. Com tudo praticamente definido, foi criada a LCF (Liga Carioca de Futebol) no Rio de Janeiro e, em São Paulo, a Apea (Associação Paulista de Esportes Athléticos) que aderiu ao novo regime permanecendo com o mesmo nome. Ato contínuo, foi fundada a FBF (Federação Brasileira de Futebol). Com a criação dessas entidades, estava implantado definitivamente o futebol profissional no país. A CBD não aderiu ao profissionalismo: manteve o amadorismo e o único grande clube que a ela permaneceu ligado foi o Botafogo. Por outro lado, a FBF não era filiada à Fifa; portanto, caberia à CBD a convocação e preparação da Seleção Brasileira para o Mundial na Itália.
No início de 1934, já prevendo o que poderia acontecer, a imprensa do Rio e de São Paulo procurou se empenhar numa campanha para que a briga entre as entidades não prejudicasse a participação da Seleção Brasileira na Copa do Mundo. Eduardo Trindade, presidente da Amea, sugeriu a adoção de um regime misto, previsto nos estatutos da CBD, com o objetivo de se chegar a um acordo. No entanto, a LCF e a Amea negaram ceder seus jogadores à CBD. Com a negativa, coube a Carlos Martins da Rocha, o “Carlito Rocha”, dirigente do Botafogo, a tarefa de montar a Seleção.
Carlito Rocha era profundo conhecedor de futebol. Experiente, sabia que iria necessitar de uma equipe forte para a disputa do torneio. O primeiro passo foi acertar com o técnico Luis Vinhais, vencedor de duas edições da Copa Rio Branco. Em seguida, partiu em busca dos profissionais, uma atitude considerada leviana, pois como poderia um defensor ferrenho do amadorismo contratar atletas profissionais? Mas, na verdade, ele tinha conhecimento de que só com amadores não chegaria a lugar algum. Na capital paulista, contratou quatro jogadores da equipe do São Paulo. Após uma partida contra a Portuguesa de Desportos, Sylvio Hoffmann, Luizinho, Waldemar de Britto e Armandinho embarcaram às escondidas para o Rio de Janeiro. No Rio Grande do Sul, acertou com Luiz Luz e Patesko. No Rio de Janeiro, o único clube prejudicado foi o Vasco da Gama: perdeu Tinoco e Leônidas da Silva. Corria o boato de que a CBD havia assinado contrato com estes atletas pagando 30 contos de luvas e ordenado de 1 conto de réis. Esta atitude levou o “Jornal dos Sports” a estampar, em sua primeira página, a seguinte manchete: “Patriotismo por 30 contos”.
Pouco adiantou o esforço. A Seleção Brasileira partiu para disputar a sua segunda Copa do Mundo sem qualquer planejamento, numa viagem cansativa, de doze dias de duração, a bordo do navio “Conte de Biancamano”. Os treinamentos, como em 1930, eram realizados no convés. As únicas exceções ocorreram quando o navio aportou em Barcelona, para o embarque dos espanhóis, que eram nossos adversários.
Os jogadores fizeram um bate-bola de aproximadamente quarenta minutos e, posteriormente, uma pelada num campinho próximo ao Estádio Luigi Ferraris. Muito pouco para quem enfrentaria uma das melhores seleções da Europa em sistema eliminatório. Não deu outra. Com menos de 30 minutos, a Espanha já vencia por 2 a 0. Leônidas ainda marcou aos 11 minutos do segundo tempo. Mesmo assim, tivemos a chance de virar o marcador. Luizinho teve um gol anulado aos 14 minutos, e Waldemar de Britto perdeu um pênalti defendido por Zamora aos 25 minutos. Dois minutos depois Lángara deu números definitivos ao marcador: Espanha 3 a 1. O Brasil estava novamente fora da Copa.
O JOGO
27/05/1934 (16.30)
BRASIL 1:3 ESPANHA (0:3)
Competição: Copa do Mundo.
Local: Estádio Luigi Ferraris, em Genoa (Itália). Público: 20.614 espectadores.
Árbitro: Alfred Birlem (Alemanha). Assistentes: Ettori Carminati (Itália), Mihaly Ivanicsic (Hungria).
Gols: 1:0 Iraragori (pênalti), aos 18; 2:0 Lángara, aos 25; 3:0 Lángara, aos 29; 3:1 Leônidas da Silva, aos 55.
BRASIL: Pedrosa; Sylvio Hoffman e Luiz Luz; Tinoco, Martim e Canalli; Luisinho, Waldemar de Britto, Leônidas, Armandinho e Patesko. Treinador: Luis Augusto Vinhaes.
ESPANHA: Zamora; Ciriaco e Quincoces; Cilauren, Muguerza e Márculeta; Iraragorri, Lángara, Lecue, Lafuente e Gorostiza. Treinador: Amadeo García Salazar.
27/05/1934 (16.30)
BRASIL 1:3 ESPANHA (0:3)
Competição: Copa do Mundo.
Local: Estádio Luigi Ferraris, em Genoa (Itália). Público: 20.614 espectadores.
Árbitro: Alfred Birlem (Alemanha). Assistentes: Ettori Carminati (Itália), Mihaly Ivanicsic (Hungria).
Gols: 1:0 Iraragori (pênalti), aos 18; 2:0 Lángara, aos 25; 3:0 Lángara, aos 29; 3:1 Leônidas da Silva, aos 55.
BRASIL: Pedrosa; Sylvio Hoffman e Luiz Luz; Tinoco, Martim e Canalli; Luisinho, Waldemar de Britto, Leônidas, Armandinho e Patesko. Treinador: Luis Augusto Vinhaes.
ESPANHA: Zamora; Ciriaco e Quincoces; Cilauren, Muguerza e Márculeta; Iraragorri, Lángara, Lecue, Lafuente e Gorostiza. Treinador: Amadeo García Salazar.
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